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Passei janeiro de 2017 todo na Cracolândia. E, de alguma maneira, isso me levou a sentar em uma cadeira de igreja no dia 30 desse mesmo mês. Olhos no altar, depois de muito tempo de costas para qualquer religião. O fluxo cruza trilhos e asfalto em três pontas no coração.
Encontrei de tudo na Cracolândia nesses últimos meses em que frequentei intensamente o fluxo da Luz, na região central de São Paulo. Conheci viajantes, ex-caminhoneiros e estrangeiros. Escutei samba surgido de galão de água, lata de tinta e palma seca. Estive com mães fortes, pais desaparecidos e órfãos de família inteira. Ganhei uma pintura de presente e ouvi histórias de rir, de chorar e de pensar. Só não encontrei o crack. Vi muita gente fumando pedra em cachimbo, mas a droga demoníaca que transforma pessoas em seres sem alma, posso assegurar que não existe. A crença, que mistura mistificação e desonestidade intelectual, de que existem pessoas possuídas vagando pelas ruas e capazes de cometer qualquer barbaridade é o maior obstáculo na luta pela dignidade dessa população em situação de vulnerabilidade. Uma disputa que A Craco Resiste tem feito ao lado dos próprios envolvidos e outros grupos desde o início de 2017. A mobilização foi uma reação ao discurso agressivo do então eleito prefeito João Doria, que se materializou em bombas e balas de borracha.
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